Certa vez, João e Manoel se encontraram na rua, por acaso, depois de muitos anos sem se verem:
- Ô Manoel, quanto tempo!!
- Fala João, que saudade cara!
- Precisamos trocar umas ideias, passa lá em casa qualquer dia.
- Pode deixar, vamos fazer uma carne, tomar uma gelada e trocar umas ideias responsas...
Foi assim que João e Manoel nunca mais se viram...
Imagino que todo mundo que inicia no Software Livre pensa, em algum momento, sobre como poderia contribuir para com a difusão e crescimento do mesmo.
Isso, em minha opinião, é uma atitude muito bonita e totalmente válida. Mas um grande problema que noto na comunidade, é que é muito tênue a linha que separa o desejo de contribuir e o de ter um projeto para chamar de seu.
Não que isso seja um problema, em minha opinião. Nós somos humanos, temos o nosso ego, o orgulho é um sentimento muito forte em nossas vidas.
O problema é quando a possibilidade de massagear o próprio ego passa a ser a causa primária disso tudo, ao invés de realmente contribuir. Poder bater orgulhoso no peito e dizer que fez isso ou aquilo, muitas vezes acaba sendo mais importante do que realmente realizar algo que faça a diferença.
O resultado disso, é que temos uma enormidade de projetos realmente fúteis e inúteis espalhados por aí, enquanto projeto importantes definham e morrem por falta de apoio.
Quem me conhece, sabe que sou mantenedor de um projeto voluntário, que me faz perder os cabelos e me presenteou com uma "linda" gastrite, por isso, vou ser bem direto e esclarecer que não vim aqui pra falar do
UbuntUCA.
Quero falar de algo muito importante na área da tecnologia educacional no Brasil que, infelizmente, vem tendo um desenvolvimento péssimo (pra não usar outra palavra) e que justamente por causa disso, tem contribuído, muitas vezes, para denegrir a imagem do
GNU/Linux nas escolas públicas.
Para quem não sabe, nos últimos anos, as salas informatizadas das escolas públicas têm recebido os famosos multiterminais, que são máquinas com um gabinete e dois ou três monitores, mouses e teclados. Assim, uma máquina é usada por até três pessoas ao mesmo tempo.
Já falei aqui no VOL do quanto esse "sistema" é horrível, cheio de bugs, que funciona de maneira sofrível e que prejudica o andamento das aulas nas salas informatizadas.
O que acontece, é que o software que gerencia esses multiterminais é péssimo, algo muito mal feito, horrível mesmo. Notem que eu não me refiro à distribuição instalada nestas máquinas, mas ao software que faz especificamente o gerenciamento das multi-sessões.
Não sei se é livre, se é fechado, só sei que aquilo, pra ser ruim, precisa melhorar muito. Além disso, a empresa que o desenvolve o trata com um descaso enorme, de tal modo que a última versão disponível do programa é apenas para o Ubuntu 10.04.
É assustador pensar que todas as escolas públicas do Brasil, que recebem os laboratórios de informática do
Proinfo, precisam de um software tão ruim para funcionar.
Pois bem, eu sinceramente espero, o dia em que alguma boa alma resolva descer, mesmo que seja por um só momento, do seu pedestal, deixe um pouco de enviar Wallpapers pro Ubuntu, pare só um pouquinho de configurar os painéis e escolher a coleção de aplicativos e o tema da sua distribuição, e resolva, em um momento de loucura, desenvolver um software decente para estes multiterminais.
Infelizmente, esse projeto não é muito conhecido, 99,9% da comunidade nem sabe que esse software de multi-sessão existe. Se você resolver o problema desses multiterminais, você não vai poder dar carteirada com isso, não vai pegar mais mulher, não vai receber um aperto de mão do prefeito do seu município ou a chave da sua cidade, não vai ficar rico (talvez até fique), mas estará ajudando centenas de milhares de crianças e adolescentes e milhares de professores por todo Brasil.
Não quero citar nomes, mas ao longo dos anos, vi dezenas de pessoas aparecendo aqui, querendo contribuir de alguma forma para com o SL, querendo escrever algumas linhas de código para projetos gigantes que já possuem centenas de desenvolvedores, ou querendo juntar a comunidade para desenvolver mais uma distribuição, ou sem meias palavras, querendo ter um projeto para chamar de seu.
Mas, na hora em que aparece algo ou alguém que realmente precisa de ajuda, o tapinha nas costas sai de graça e todo mundo promete "ir lá em casa tomar um chimarrão" (mas nunca vai).
Enquanto nós somos bombardeados por novas distribuições, praticamente todos os dias, projetos realmente importantes morrem, ou situações que precisam de uma solução (mas que não dão ibope ou não têm poder de marketing), são esquecidas e ignoradas.
Eu não me canso de dizer que o Software Livre é um campo fértil e que precisa de trabalhadores. Mas precisamos de menos caciques e mais índios. Precisamos de gente que queira trabalhar e se comprometer com a causa, que esteja disposto a sacrificar os seus fins de semanas e feriados, ou mesmo de virar noites em claro trabalhando por algo, do qual ele nunca poderá se gabar para os amigos ou com o qual ele nunca poderá impressionar uma gatinha.
Precisamos de pessoas que entendam que mesmo em um projeto livre, ainda existe hierarquia e que ficar "dando palpite" de temas, ícones, disposição de painéis, qual interface usar, qual aplicativo deve entrar pra coleção, não é contribuir e sim encher o saco de quem realmente trabalha.
Conclusão
E sim, isso aqui é um desabafo, mas é também um recado para você que quer contribuir para com o Software Livre, mas não sabe como e onde poderia ajudar.
E também para você "distreiro" de plantão, que ao invés de lançar mais um Ubuntu com papel de parede diferente, pode empregar seu conhecimento em algo realmente importante, como um software decente para esses multiterminais do Proinfo, por exemplo.